24 de setembro de 2021

O casarão do Baixio, marco do auge canavieiro do Quincuncá - Por Guilherme Pereira

Vista do casarão do Baixio, em foto capturada da estrada de acesso ao Sítio Fazenda - Foto: BQ.

    Localizado há pouco mais de 1,0km de Quincuncá, município de Farias Brito, Ceará, o Sítio Baixio leva esse nome porque é nessa área onde desagua a Barragem do distrito. Nele, um casarão de oito cômodos com sótão é testemunha dos tempos áureos da cana-de-açúcar na Serra do Quincuncá, representando também o grande poder aquisitivo de seus proprietários, considerando a imponência de sua edificação para a época. 

   Construído em 1909, conforme depoimentos da Sra. Francisca Guilhermina da Silva (69 anos), que há 21 anos vive no local. A propriedade pertenceu a Pedro Firmino Pereira da Silva, nascido em 10 de junho de 1892, filho de José Tibúrcio Pereira e Candida Gonçalves da Silva, e falecido em 24 de março de 1962. E que era casado com Raimunda Pereira de Souza, por vezes registrada como Raimunda Maria de Jesus, conhecida como "Raimunda Gregório", que nasceu em 08 de dezembro de 1871 e faleceu em 30 de dezembro de 1952, filha de Gregório Pereira de Souza e Antônia Moreira de Souza. 

   O casal que não deixou descendentes diretos, aparecem por várias vezes como padrinhos de batismo em cerimônias ocorridas na Igreja de São José em Quincuncá, o que denota mais uma vez suas condições financeiras favoráveis, isto porque ao serem escolhidos para esse encargo, caso os pais viessem a faltar, os padrinhos é quem assumiam a responsabilidade pela criação das crianças. 

    Além do referido casarão e das terras nos seus arredores, o Baixio, ainda era constituído de um açude, e um engenho de tração animal, situado ao lado da residência, onde anualmente eram realizadas as moagens, produzindo grande quantidade de rapadura, alfenim, cocadas e outros derivados da cana-de-açúcar, como a cachaça, que era apreciada pelos proprietários e mais próximos. A produção destinada a consumo próprio e a comercialização, provavelmente nas feiras da região, findou tempos após a morte de Dona Raimunda em 1952. 

  Dentro dos limites da propriedade, habitavam ainda outros moradores. Um registro eclesiástico de 1931, indicam que um desses eram: Antonio Duque de Morais e Etelvira Ribeiro de Morais, esta última tia de Telina Almeida, que foi professora em Quincuncá. Segundo relatos de Teodorica Moreira de Souza, nascida neste Sítio em 1946, já no final dos anos 1930 e início dos 1940 em diante, também foram ali moradores: Seu Luiz e Dona Lina (pai e madrasta de Rosa Nogueira), Seu Martim, sua esposa D. Cecília e sua filha, Maria, além de seus pais, João Timóteo dos Santos e Gertrudes Gonçalves da Silva. Ambos residiam em casas de pau-a-pique (taipa), distantes uma da outra, mas que ficavam sob a tutela de Pedro Firmino. A partir de 1958, ainda segundo ela, esses moradores mudaram-se para outras localidades, à exemplo de seus genitores, que passaram a residir na sede do distrito, ficando apenas Pedro Firmino, que nesse tempo já se encontrava enfermo. 

   Falar no Baixio é também reacender assombrações. Conforme relatos, os antigos donos antes de falecerem deixaram botijas, isto é, vasilhames de barro ou metal com tesouros (geralmente ouro e dinheiro). Diz a sabedoria popular que tais bens só podem ser retirados por quem fosse destinados, caso tudo se transformaria em pó. Furtuoso Dias de Alcântara (pai de Iva Dias) e Luíza Moreira de Souza (filha de Gertudes, moradora local), foram os encarregados por achar e tomar para sí esses tesouros, todavia, nunca tiveram coragem para tal. Segundo a irmã de Luíza, Teodorica Moreira, após a morte de Pedro Firmino em 1962, sua irmã passava noites sem dormir, chorosa, com pesadelos terríveis, fatos que futuramente cessaram. 

Uma das casas de propriedade do casal, hoje muito descaracterizada e deteriorada. 

   A riqueza do casal não se resumia apenas a essa fazenda, os mesmos eram detentores de outras posses, como uma casa situada ao final da Rua José Alves Costa (saída para o Sítio Tabuleiro), que segundo Francisca Dias da Costa, foi erguida em 1907. Dados do recenseamento do IBGE de 01 de setembro de 1920, atestam que Pedro Firmino era possuinte de terras em Araticum (Quincuncá) e no lugar denominado Alagoinha. Essa extensa quantidade de terras, associada a prática arrendatária e a criação de bovinos, caprinos e ovinos, o tornavam "o maior homem que tinha as coisas aqui na Serra", conforme frisou Teodorica Moreira.

   Após a morte de Pedro Firmino em 1962, suas posses passaram a ser administradas pelo seu afilhado, Pedro Pompeu, que posteriormente as vendeu para o Sr. Jesus Alderico Costa (Dorico), falecido em 2002. Atualmente, em estado razoável de conservação, a propriedade Baixio e suas terras são alvo de luta na justiça pelos herdeiros do último dono. 

Confira outros registros: 

Vista de satélite via Google Maps. As setas em vermelho indicam o caminho.
 
Caminho do Sítio Baixio com o casarão ao fundo. 

A fachada do casarão originalmente tinha 03 portas e duas janelas.

 
Lateral direita da casa. A senhora que aparece no canto esquerdo é Teodorica Moreira. 

Sala principal - Foto: Blog de Quincuncá - 17/09/2021.

Corredor, com destaque para a estrutura de madeira do sótão, local onde se guardava mantimentos.

Detalhe do piso no interior do casarão. 


Fundos do casarão - Foto: BQ. 


Sotão, espaço que era utilizado antigamente como armazém. 


Detalhe da cumieira, isto é, a parte mais alta do telhado. 



Vista em frente a casa. Local onde se cultivavam cana-de-açúcar. 


Açude da propriedade, que ao longo das décadas foi refeito várias vezes. 
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FONTES ORAIS:

Francisca Dias da Costa, 81 anos;

Francisca Guilhermina da Silva, 69 anos - Entrevista realizada em 17 de julho de 2021 / 17 de setembro de 2021;

Teodorica Moreira de Souza, 75 anos - Entrevista realizada em 17 de setembro de 2021;


FONTES ESCRITAS: 

Livro microfilmado de óbitos nº 14, da Paróquia de Assaré-CE, p, 74, nº 24, arq. 4129531_02149;

Recenseamento do IBGE, 01 de setembro de 1920;

Livro de óbitos nº 02, p.10v/11 - Óbito de Raimunda Pereira de Souza e Livro de óbitos nº 04, nº ordem 962/22 - Óbito de Pedro Firmino de Sousa - Cartório de Registro civil de Quincuncá - Cartório Moreira do 1º Ofício - Farias Brito-CE

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Agradecimentos a Sra. Teodorica Moreira de Souza por me acompanhar em uma das visitas ao local, onde ela viveu boa parte de sua vida. Agradeço igualmente a Roberto Júnior, pela sugestão para o título desse artigo. 

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